Nos momentos de decisões difíceis nas nossas vidas sentimentais, nós viramos verdadeiros campos de batalha onde sentimento e razão batem de frente um com o outro de maneira implacável. Parece que somos impiedosamente divididos em duas partes iguais e puxados para dois extremos simultâneamente, rasgados como uma fina folha de papel. Não sabemos ao certo á quem ouvir, ou o que queremos ouvir. Não sabemos o que fazer, muito menos como fazer. Chega uma hora que o conflito interno é tão intenso que não sabemos se podemos confiar em nós mesmos e nas nossas decisões, ficamos olhando por cima do ombro preparados para sermos apunhalados pelos sentimentos que cultivamos, ou pela razão que adotamos.
Quando seu coração aponta para um lado e sua cabeça para outro, sua força de vontade começa a ser posta á prova. O desgaste da sua paciência, auto-controle e maturidade se iniciam e se essas virtudes forem fracas em você, você quebra. Você olha para si mesmo e vê os sentimentos que você mesmo acorrentou queimando de dentro para fora, te consumindo lentamente, ao mesmo tempo em que mede os danos que seriam causados se tais sentimentos fossem liberados. É como um general observando suas tropas morrerem em campo de batalha sem poder interferir, ele sabe que é por um bem maior, sabe que aquilo é necessário, mas também sabe que cada vida perdida é um sofrimento.
Cada palavra não dita, cada ligação não feita, cada mensagem não enviada. Cada uma das coisas que seus impulsos mandaram você fazer e você não fez são uma pequena morte dentro de você, você lamenta elas lá no fundo e chora por elas terem morrido no anonimato. Mas a guerra não acabou, e enquanto a guerra não acaba, mortes continuam acontecendo. A frieza de olhar o número de casualidades aumentando e mesmo assim continuar a mandar soldados para o campo de batalha faz você olhar para si mesmo com um certo orgulho misturado com repugnância. Orgulho por ter capacidade de fazê-lo, e repugnância por fazê-lo.
Olhando para o bem maior, você usa sua razão para enxergar a situação á longo prazo e começa a fazer sacrifícios que parecem tão grandes e tão pesados, que você chega a se perguntar se vale mesmo a pena fazê-los, algum tipo de energia parece preencher os gritos sufocados dos sentimentos que você está mandando para a cova. Eles lhe assombram como fantasmas a noite, tirando seu sono. E cada vez que uma deles parece estar tomando proporções muito grandes, você fecha as garras da razão em torno deles e os sufoca com pessimismo e frieza, apertando com muito mais força do que o necessário, deixando eles lá, no fundo da sua mente, agonizando com frio e fome. Pois essas são as causas naturais de morte deles.
Você olha para tráz e vê todo um cemitério das mortes que você causou e um tipo de frio na espinha vem quando você se dá conta de que não estão olhando nem para metade do total de mortos que ainda estão por vir. Você pensa em abandonar o cargo, pensa que não vai ser capaz de aguentar o choro melancólico de seus sonhos enforcados, gargarejando sangue na forca que você construiu para eles. Você olha para o quadro de desespero e pensa que que já viu de tudo, que nada pode piorar.
Você pode se recusar a batalhar com os outros, pode educadamente se retirar da linha de fogo alheia e evitar conflitos. Mas você não pode escapar de si mesmo, a razão diz com sua vóz gélida que você ainda vai ver muitas mortes, que muitos dos sonhos e sentimentos que você cultivou, alimentou e criou vão morrer pelas suas mãos, te diz que você ainda será banhado com o sangue tantos deles que não restará nada além de um campo vazio e morto onde antes havia um mar de rosas.
E seus sentimentos mandam você se render, baixar suas defesas, parar de resistir e deixar eles tomarem conta de tudo, deixar que todas as suas impetuosas atitudes sejam concretizadas, afim de satisfazer o desejo incontrolável de serem sincera e honestamente correspondidos. Só isso que eles querem, retribuição. Eles te botariam de joelhos por isso, eles sacrificariam qualquer coisa por isso, inclusive a própria vida. E é por isso que seu luto parece não ter fim, porque no fundo, o extermínio que você está comandando só está acontecendo porque não há quem os alimente, você não pode sustentá-los sozinho, e na ausência de alguém para ajudá-lo a fazer isso, você fica com o trabalho sujo.
E com sangue nas mãos, gritos nos ouvidos e silêncio nos lábios, você continua fazendo o que tem que fazer, pois ninguém pode guerrear por você.
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