Procurando algo específico?

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

As engrenagens do medo


Medo é um mecanismo de sobrevivência que funciona por associação, como somos programados para evitar aquilo que nos causa dor, nossos cérebros estão muito bem preparados para evitar também qualquer coisa que esteja associada a dor.

É racional que depois de algumas picadas de aranhas, nossos ancestrais tenham percebido que elas são perigosas e não deixaram seus bebês chegarem perto delas, os bebês que não aprendiam a temê-las eram picados e mortos, logo a seleção natural se encarregou do resto e hoje praticamente qualquer pessoa tem um saudável medo de aranhas. Mas ser picado por aranhas é algo objetivamente ruim, não tem como uma pessoa gostar disso, ou achar que é algo que faz bem, não há muito espaço para se argumentar que picadas de aranha são uma coisa boa ou necessária. A associação de aranha com dor e perigo é útil, saudável, e nunca vai te privar de viver experiências interessantes, se alguém insistir que medo de aranhas é algo tolo, bastará uma picada para fazê-lo mudar de idéia.

Mas o problema é que não temos apenas medos simples, óbvios e saudáveis, como medo de aranhas ou de altura. Nem todos os nossos medos estão diretamente ligados á nossa sobrevivência no tempo das cavernas, com o passar do tempo nosso cérebro foi ficando muito sofisticado, muito mais do que nós conseguimos entender. Com isso desenvolvemos maneiras extremamente complexas e sutis de aplicar um mecanismo antigo (associação) numa mente moderna.

Como isso funciona? Bem, como você acha que fazemos para associar amor com dor?

Diferente da picada de aranha, sofrimento não está ligado ao amor e á paixão de maneira simples e objetiva. Quando se sofre por causa de relacionamentos, o normal é associar a dor que sentimos com elementos que fazem parte da situação na qual estamos, e esses elementos podem ser qualquer coisa, como uma música, uma determinada atividade, lugares e até características da personalidade da pessoa (não necessáriamente as que causaram a dor e o término). Sendo assim, seu cérebro pode te fazer temer situações novas e cheias de possibilidades apenas porque algum aspecto nelas te relembra sua experiência passada. E, convenhamos, quanto mais experiências você tiver, mais associações vai fazer, logo você se torna um campo minado de medo, onde qualquer pessoa que for se aproximar de você vai ter que ser extremamente cautelosa para não disparar nenhum mecanismo de auto-defesa que fará com que você se feche e saia correndo para se proteger.

Devemos lembrar que não estou usando a palavra "mecanismo" sem motivo, associação é puramente mecânica, ela não é seletiva com aquilo que lhe é útil ou construtivo, ela não vai fazer julgamentos morais e ver os dois lados da moeda, ela vai fazer você ter medo de se machucar de um número cada vez maior de coisas indiscriminadamente, ela não leva em conta seus defeitos, o tanto que você precisa progredir, ou seu grau de maturidade, não. Ela opera em cima do seu sofrimento e ponto final. Pense bem, você se relaciona com pessoas com diferentes defeitos, se você for acumulando os defeitos de suas experiências passadas e transformá-los numa imensa lista de pré-requisitos, estará dificultando muito que os outros se aproximem de você (ela não pode ser baladeira como a Fulana, nem quietona demais como a Cicrana, nem faladeira como a Beltrana...). Manter a fonte do perigo longe é justamente o objetivo do medo, e a associação vai garantir que isso aconteça se você não ficar atento.

Mas pré-disposição biológica não é desculpa para você deixar de viver a vida, ou vivê-la de forma errada, afinal todos os homens são, por definição, biológicamente programados para a poligamia, mas isso não quer dizer que devamos adotá-la como estilo de vida esperando que isso irá nos satisfazer emocionalmente. Assim, nossa incrível capacidade de fazer associações para temer tudo que seja potencialmente perigoso também é um mecanismo antigo que deve ser dominado pela nossa mente moderna, não o contrário. Medo afasta, separa e isola. Medo fecha portas, obstrui caminhos e ofusca possibilidades. Olhando de um ponto de vista prático, medo é uma ferramenta que aó existe para nos manter vivos, sendo assim, se você parar para pensar, nessa vida...

...não há muito o que temer.

Nenhum comentário:

Postar um comentário